Páginas

quarta-feira, março 11, 2009

Ciência em Nietzsche


Alguém ... " ousou confessar que sentia mais satisfação em procurar a verdade do que na própria verdade: e assim foi desvendado de surpresa, para grande raiva dos sábios, o segredo fundamental da ciência. Entretanto, ao lado dessa confissão isolada, desse excesso de franqueza, senão de petulância, constata-se uma ilusão profundamente significativa ...: essa inabalável convicção de que o pensamento, pelo fio condutor da causalidade, possa penetrar até os mais profundos abismos do ser e tenha o poder não somente de conhecer, mas também de corrigir a existência. Essa nobre ilusão metafísica é o instinto próprio da ciência, que a conduz e a leva sem trégua a seus limites naturais, onde deve então transformar-se em arte - o objetivo real para o qual tende esse mecanismo (grifo do autor). 

Consideramos agora Sócrates à luz deste pensamento: ele nos aparece então como o primeiro que pôde não somente viver, mas também morrer em nome desse instinto da ciência: e é por causa disso que a imagem de Sócrates moribundo, do homem libertado, pelo saber e pela razão, do temor da morte, é o brasão suspenso sobre a porta de entrada da ciência, para relembrar a todos que a causa final da ciência é a de tornar a existência compreensível e, por isso mesmo, justificá-la: para o que, naturalmente, caso as razões não sejam suficientes, deve servir também no final de contas o mito, que acabo de apontar como a consequência necessária, como o objetivo real da ciência."

(Friedrich NIETZSCHE, O Nascimento da Tragédia, Editora Escala, São Paulo, 2007.)



Nenhum comentário:

Postar um comentário