Caros colegas físicos
do Brasil,
Vimos presenciando na mídia de massa uma banalização dos
assuntos
relacionados à física e às ciências em geral. Comumente,
vemos e
ouvimos alguém falar da ligação da física (em especial a
quântica)
com a medicina (cura quântica), com as religiões, com a
espiritualidade, etc. Recentemente, tivemos alguns exemplos
frustrantes sendo explorados: o filme "Quem somos nós", que
relaciona
(erroneamente) diversos conceitos do universo quântico com a
física do
nosso dia-a-dia; o livro "O segredo", que, de acordo com a
autora, "cada um contém uma força magnética dentro de si mais
poderosa do que
qualquer coisa neste mundo emitida por seus pensamentos" e,
com isso,
afirma que pode atrair coisas boas; as pulseiras "Power
Balance", que
promete efeitos bioquânticos para gerar
"aperfeiçoamento do equilíbrio, ampliação da força central, aumento do
alcance dos movimentos e bem estar total" (retirado do
panfleto do
produto); dentre outros exemplos que poderia citar. Sei que,
hoje, com
todo o conhecimento que temos, não conseguimos, de fato,
refutar todos
os argumentos colocados, principalmente pela maioria se tratar
de
assuntos metafísicos (que, na verdade, não estamos tão
interessados em
tratar). Mas, sabemos o que não pode ser e podemos ajudar a
desmistificar alguns desses absurdos.
Apenas a titulo de informação, uma medida recente tomada
pela ANVISA
foi proibir a comercialização de 9 nove medicamentos
fitoterápicos.
Nas bulas e caixas dos remédios deste tipo que ainda não
foram
comprovados experimentalmente vem um aviso: "PRODUTO EM
ESTUDO PARA
AVALIAÇÃO CIENTÍFICA DAS INDICAÇÕES TERAPÊUTICAS E DA
TOXIDADE. O USO
DESTE PRODUTO ESTÁ BASEADO EM INDICAÇÕES TRADICIONAIS".
A consequência dessas práticas é que o povo, em sua
esmagadora
maioria, leigo no assunto, compra as idéias (e os produtos
gerados
dessas) e solidifica esses conceitos na cabeça. Isso é
inevitável, uma
vez que o ser humano é curioso e ávido por explicações. Daí,
quando
alguém com formação e experiência comprovadas no assunto tenta
dizer o
contrário explicando os conceitos da forma correta, já é
tarde, pois
ninguém mais acredita (vivi e convivi com essas experiências).
Nossa
sociedade está alheia à natureza à sua volta e à toda a
tecnologia que
está em seus bolsos e lares.
No meu ponto de vista, a culpa desses desentendimentos não é
da
sociedade (leiga). A má fé de alguns grupos de empresários
que se
aproveitam da ignorância para "fazer" dinheiro (às vezes
até
inconscientemente) contribui para essa alienação, mas acredito
que
grande parte dessa responsabilidade é dos profissionais que de
certa
forma detêm esses conhecimentos, ou seja, NÓS.
De que forma será que podemos contribuir para transformar
essa
realidade? Publicando artigos em revistas de reduzido
acesso? Mantendo
as informações sobre nossas pesquisas nos grupos de trabalho
dos quais
fazemos parte? Endosso a importância dessas atividades no
meio
científico, mas, de alguma maneira, precisamos deixar isso
"vazar" de
nossos nichos, dar acesso a todos. Como? Procurando e se
deixando
encontrar nos meios de comunicação vigentes. Mandar cartas
aos
editores das colunas científicas dos jornais, entrar em
contato com
jornalistas para dar entrevistas (deu certo com nosso grupo),
fazer
palestras para qualquer audiência (de qualquer idade) em
locais
públicos ou de fácil
acesso e divulgação, etc. Enfim, correr atrás de retornar
para a
sociedade tudo aquilo que adquirimos com nosso tempo de
experiência é
parte de nosso dever.
Vamos lá, façamos nossa parte!
Atenciosamente,
Daniel Neves Micha
Professor do curso de licenciatura em física do CEFET/RJ
Campus Petrópolis
Doutorando em física pela UFRJ
Integrante do INCT de Nanodispositivos Semicondutores
(DISSE)
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